quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Eólicas: O que penso e o que sinto


Os parques eólicos, que têm proliferado nas mais inóspitas serranias, são foco de grande discussão e geradores de alguma controvérsia. Tenho lido e ouvido vários argumentos e as tomadas de posição subsequentes. Desta profusão de opiniões, noto existir uma verdade algo desvirtuada, não por intenção deliberada, mas por se basearem em pressupostos não objectivos.
Embora seja um leigo nesta matéria, sou alguém interessado e tento fundamentar-me com base no conhecimento. Mas, quando reflecti neste assunto, despoletaram em mim duas opiniões distintas e contraditórias. Esta dicotomia espontânea, que parecia fracturante e incongruente, era apenas o reflexo do dualismo existente em todo o ser humano, induzido pelas faculdades do pensar e do sentir.
Quando sinto: Sou o resultado das minhas emoções, intuições, dos interesses comezinhos, do egoísmo endócrino, da subjectividade… Por isso, quando subi à “minha serra” e fui confrontado com aqueles mega moinhos de vento que pareciam evocar os gigantes de “D. Quixote”, senti-me como se me tivessem espoliado de um legado dos meus antepassados. Aquele pedaço de natureza ancestral estava irreconhecível. As múltiplas estradas de acesso às torres rasgavam as entranhas daquela terra inviolada, como cicatrizes indeléveis da civilização. O mato selvagem, o chão imaculado estavam conspurcados com o descartável lixo da sociedade de consumo, testemunho da incivilidade que grassa por cá. Onde pastores de rostos magros e tisnados, sentados nos megalíticos penedos, desfrutavam do silêncio apenas entrecortado pelo canto das aves ou pelo balir do rebanho. Deambulava gente alva e bem nutrida, auto movida… e o silêncio não se escutava. Foi substituído pelo rugir dos motores e as vozes estridentes de citadinos eufóricos, motivados por esta cómoda aventura domingueira que lhes preencherá as conversas fúteis e as vidas rotineiras da semana. Até o vento parecia invocar, melancólico e nostálgico, o tempo antigo, em que aquelas pás afiadas não lhe desferiam golpes lancinantes que o impedem de soprar e voar livremente. Não os queria ali!... Desejei que aquele quadro se esfumasse e me devolvessem a “minha serra”, tal e qual ela era, ermitério de alguns privilegiados, onde não chegavam os ruídos e os malefícios da modernidade.
Quando penso: Sou refém da racionalidade, da lógica dedutiva, da objectividade, do conhecimento testado e quantificado … Assim sendo, sei que somos um país dependente dos combustíveis fosseis, que poluem e oneram o erário público; Sei que temos cotas de energias renováveis assumidas no seio da União Europeia, que temos de cumprir no prazo estipulado; Sei que não existe uma solução energética capaz de satisfazer as necessidades mundiais; Sei que os parques eólicos têm menos impacto ambiental que a construção de uma central hidroeléctrica…
Sabendo o que se sabe, temos que concluir que, para equilibrarmos o factor energia versus ecologia, são necessárias soluções integradas que contemplem as diferentes formas de a obter. Não podemos redundar num fundamentalismo ecológico de sermos contra tudo. Ou então, teremos de estar dispostos abdicar dos padrões de vida que desfrutamos.       
Não existem energias completamente limpas. Directa ou indirectamente, em maior ou menor escala, todas acarretam implicações ambientais. A intervenção humana altera a dinâmica dos ecossistemas, com consequências nefastas e, por vezes, irreversíveis. Mas este é o preço que pagamos, desde os primórdios da humanidade, para obtermos o almejado progresso.
As energias renováveis são uma parcela a considerar na equação energética mundial. Países mais evoluídos, onde a palavra ecologia não é um mero formalismo, estão a intensificar o investimento nesta área. Portugal não pode descartar estes recursos. Deve é faze-lo de forma controlada e respeitando as normas ambientais para a sua implementação. Os fins não podem ser obtidos sem olhar a meios, nem prevalecer exclusivamente os factores económicos e os interesses empresariais. Mas, pelo que tenho observado, não me parece que o impacto ambiental e o enquadramento paisagístico, tanto neste como noutros contextos, sejam os factores primordiais nos estudos prévios que orientam estes e outros projectos.  
 Por isso, o sentimento que nutro pelo parque eólico de Montemuro é o mesmo que sentimos pelos aterros sanitários. Sabemos que são necessários e todos contribuímos para a sua existência, mas não os queremos à nossa “porta”
Vítor Silvestre