sábado, 30 de abril de 2011

Casas de Montanha da Gralheira

Já estão em funcionamento as Casas de Montanha da Gralheira. São dois T1s construídos em madeira, com capacidade para 4 pessoas cada um, que vão possibilitar uma estadia agradável e confortável a todos aqueles que quiserem visitar e desfrutar da tranquilidade da nossa aldeia e da beleza da nossa serra.
 
 





segunda-feira, 25 de abril de 2011

O Compasso Pascal

O compasso, efetuado no domingo de Páscoa, permanece intrincado nos rituais religiosos das pequenas comunidades. Esta prática, outrora generalizada, foi-se perdendo nos meios mais cosmopolitas. Grandes áreas demográficas e a laicização da sociedade inviabilizaram, restringiram ou modificaram a sua realização.
Mas, na Gralheira, a tradição ainda é o que era. Todos os anos, o cortejo pascal percorre as ruas da freguesia com a pragmática instituída. Constituído por cinco elementos: Padre, sacristão com a cruz, campainha, caldeirinha e o do folar. O primeiro e o segundo são inerentes ao cargo, o terceiro é nomeado pelo sacristão, os restantes são designados pelo padre e o lugar é, praticamente, vitalício. Em especial o último, pois tem de ser da inteira confiança para colocar os e envelopes segundo a ordem do percurso, para o pároco poder contabilizar quanto recebeu de cada paroquiano e garantir que nenhuma oferta seja subtraída. O que a acontecer, não seria inédito.
Os moldes em que decorrem a visita pouco se alteraram, mas o folar que era pago em ovos, gradualmente, foi substituído por dinheiro. Isso facilitou a vida ao padre e ao seu fiel depositário. Eliminando, num dia de passos ébrios, o risco da perda de artigos tão perecíveis e o incomodo de carregar com a cesta destinada ao transporte dos mesmos. Foram estas circunstâncias que propiciaram a história que vou contar:
O “Gabiru”, certo ano, foi indigitado pelo prior para fazer parte do séquito do compasso, com a incumbência de recolher os ovos. Compareceu no adro, integrou a comitiva e foi executando a tarefa que lhe fora confiada, mas com determinada peculiaridade. Ao contrário dos seus antecessores que quando tinham necessidade de despejar a cesta se dirigiam a casa do pároco, resolveu estabelecer uma parceria quanto à divisão dos proventos. Assim, alguns carregamentos foram parar à sua despensa, ao invés da residência. Como a quantidade recebida era abundante e o “Gabiru” teve o bom senso de ser comedido na partilha, o desfalque não foi notado. Mas, no ano seguinte, quando se apresentou para a “desobriga”, perante o confessor, não teve coragem de omitir a falta e disse:
- Ò Sr. Abade, o ano passado roubei parte do folar que lhe era destinado.
O padre, incrédulo com tal acto, reflectiu e disse-lhe:
- Cometeu um pecado muito grave, para ser perdoado tem que comprar uma bula de composição.
- E quanto custa?
- Dez tostões.
O homem, surpreso com a cifra, não se conteve e exclamou:
- Ovos tão baratos, nunca comi na minha vida!..
Esta história foi-me contada por várias pessoas que afirmaram tê-la ouvido do próprio. Se assim foi, só ele e o padre a podiam confirmar, mas tal já não é possível.
Independentemente deste episódio ser ou não verídico, o dia de Pascoa continua a ser uma festa animada e de grande convívio na freguesia. A ronda da cruz é seguida por uma trupe de comensais que de casa em casa e de libação em libação vão dando forma a um ambiente de súcia contagiante . Mesmo os convivas mais inibidos e menos folgazões exteriorizam as suas emoções, animados pela espiral de euforia generalizada.
É nestes momentos de convívio que, nesta nova era, se vislumbram as reminiscências de uma comunidade antiga, forjada na interioridade de um Portugal profundo, pobre e letárgico. Das múltiplas carências e privações emergiu um espírito comunitário coeso, fundamentado na entreajuda e na partilha. A noção de família era extrapolada para além do agregado, induzindo uma sensibilidade colectiva que comungava das alegrias e tristezas, congregando esforços em prol do bem comum.
Nem tudo, o tempo mudou…
Vítor Silvestre

domingo, 10 de abril de 2011

Numa Austera, Apagada e Vil Tristeza!

Este é o epitáfio adequado ao estado mórbido em que se encontra o património histórico português. É inconcebível e inaceitável que um país com quase novecentos anos de história despreze de forma ignóbil o seu passado. Basta percorrermos os caminhos da nossa terra para nos apercebermos da negligência e da incúria a que as autoridades competentes devotaram uma parte substancial dos nossos monumentos. Muitos já não passam de ruínas; Outros parcialmente preservados, pois embora estejam restaurados, por norma, carecem de um enquadramento informativo adequado, quer pela falta de rigor de quem os tutela, quer pela insípida formação dos colaboradores que aí trabalham; Alguns foram convertidos em pousadas e hotéis que, embora existam exemplos de uma reabilitação bem preconizada, só ficam acessíveis a poucos, ficado a maioria privada de um legado que é de todos. É constrangedor ver a displicência com que se ignora potencial turístico das obras dos nossos antepassados. Inúmeras vezes, encontro as torres de menagem fechadas a cadeado, sem qualquer uso, como testemunhas estóicas da passada glória, em locais onde o castelo é o único ponto de interesse. Portugal, não é só Sol e praia, tem um património cultural e histórico riquíssimo que deve ser reabilitado, conservado e publicitado. De Espanha pode não vir bom vento nem bom casamento, mas sabem cuidar dos seus monumentos, promover a sua cultura e não esquecem a sua história.     
Esta indignação antiga foi acicatada após uma visita ao Forte da Graça, em Elvas. Enquanto deambulava pelos baluartes, revelins, casamatas e demais dependências da fortaleza senti-me vilipendiado com o seu estado de degradação. Os anos de abandono deixaram à mercê do tempo, do vandalismo e da pilhagem o ex-líbris da arquitectura militar do SEC. XVIII. Aforaram-me à memória as palavras de Sousa Viterbo, citadas por Rainer Daehnhardt no seu livro Homens Espadas e Tomates: “Onde estão as armaduras dos cavaleiros que assaltaram Ceuta, Arzila e Azamor? Que é das lanças e espadas dos que ajudaram Afonso de Albuquerque a conquistar Goa, Ormuz e Malaca? Que é dos mosquetes que derrubaram os batalhões holandeses nas batalhas de Guararapes?” São perguntas que por mais que queiramos escamotear com respostas estereotipadas, segundo o historiador citado, invocando: a pobreza, o terramoto de 1755, o domínio espanhol ou as invasões francesas, todas redundam na inconsciência e no desleixo. O problema está como interpretamos e aplicamos a palavra “velho”: Enquanto para outros significa respeito, estima e digno de ser preservado; Para nós é obsoleto, desnecessário e, assim, desprezamos a nossa identidade histórica.
Voltado ao forte Conde do lippe, como originalmente foi designado, o seu aspecto é avassalador. A estrutura maciça composta por três linhas de defesa, destacando-se no reduto central a casa do governador, conferem-lhe uma imponência sólida, inexpugnável que impunha respeito aos invasores. Idealizado por este diplomata e militar alemão incumbido, pelo Marques de Pombal, de reorganizar o exército português, foi erigido no alto do Monte da Senhora da Graça, local estratégico na defesa de Elvas. A cidade, no decurso da guerra da restauração, durante o cerco de 1659 foi fortemente flagelada pelas baterias espanholas aí instaladas. A guerra dos sete anos veio reiterar a necessidade de fortificar aquela posição elevada, de forma a estabelecer um bastião fronteiriço capaz de desencorajar as incursões inimigas. A sua construção foi iniciada no reinado de D. José, mas seria inaugurado no da sua filha Dna. Maria. Os trabalhos prolongaram-se durante trinta anos, envolvendo um total de trinta e dois mil homens e quatro mil animais, sendo o seu custo estimado em 769.199.039 reis. Sofreu dois cercos: em 1801, durante a guerra das laranjas e, em 1811, na guerra peninsular pelo general Soult, mas não passaram de vãs tentativas intimidatórias, limitando-se a acção a algum fogo de artilharia. Com a perda progressiva da sua importância estratégica, o Estado Novo converteu-o em presídio militar. O Forte de Elvas, como era conhecido, tornou-se um fantasma que assombrava as mentes dos magalas. Mesmo depois da sua desactivação, continuou enraizado ma memória colectiva como um símbolo de sevícias e de trabalho forçado, em que os presidiários eram obrigados a transportar toda a água necessária ao consumo da guarnição.
O Forte da Graça, o Forte de Santa Luzia e as fortificações da cidade, conferem a Elvas Um sistema de defesa ímpar em Portugal. Apenas Almeida, embora em menor escala, se assemelha a esta praça-forte que se converteu na sentinela vigilante da fronteira alentejana. É merecedora de uma demorada e atenta visita, onde cada pedra representa a vontade de um povo que, contrariando os desígnios da História, “desenrascou” a sua identidade e independência, legou o conhecimento do mar e deu “ novos mundos ao mundo”.   
                                                                                                                                           Nelo Montemuro.



                          
                           No mais, Musa, no mais, que a Lira tenho
                                   Destemperada e a voz enrouquecida,
                                   E não do canto, mas de ver que venho
                                   Cantar a gente surda e endurecida.
                                   O favor com que mais se acende o engenho
                                   Não no dá a pátria, não, que está metida
                                   No gosto da cobiça e da rudeza
                                   De uma austera, apagada e vil tristeza.
                                                                                      Lusíadas canto X